21/10/2021

Pesquisa promete fazer do carvão catarinense a base de uma indústria de energia limpa

Engenheiros do CTSatc, de Criciúma, desenvolvem uma tecnologia para neutralizar as emissões de carbono de termelétricas e fábricas.

De uns tempos para cá, executivos e técnicos de grandes grupos empresariais – entre os quais a petroquímica Repsol, a fabricante de refratários RHI Magnesita e a fundição Tupy – passaram a acompanhar com interesse um conjunto de pesquisas conduzidas no Centro Tecnológico Satc (CTSatc), em Criciúma, no Sul de Santa Catarina.


Nos laboratórios da instituição, um grupo de engenheiros dedica-se há anos ao desenvolvimento de uma nova tecnologia para capturar o carbono emitido na queima de combustíveis fósseis tanto em centrais geradoras de energia quanto em indústrias. “Somos cada vez mais procurados por companhias como essas para saber mais sobre o nosso trabalho”, diz o engenheiro químico Thiago Fernandes Aquino, líder do Núcleo de Energia e Desenvolvimento de Produtos do CTSatc.


Dá para entender o que tanto atrai o mercado. Empresas do mundo inteiro batalham para diminuir as emissões de gases causadores de efeito estufa, pressionadas tanto por governos e órgãos reguladores correndo contra o tempo para cumprir metas firmadas em tratados internacionais quanto por consumidores e investidores para quem as questões ambientais passaram a ocupar o topo da agenda.


O assunto é particularmente importante para o setor elétrico. Nos últimos anos, houve um expressivo crescimento na geração solar e eólica. Essas fontes não são estáveis o suficiente para sustentar sozinhas o fornecimento de energia – prova disso é a crise pela qual passa no momento a União Europeia, onde uma estação de pouco vento está comprometendo o sistema elétrico.


Situações assim reforçam o papel das termelétricas para dar segurança ao fornecimento de energia – mas  para isso essas usinas terão de se adaptar, neutralizando suas emissões de gases. Para se ter uma ideia, os projetos na área de captura, utilização e armazenamento de carbono (CCUS, na sigla em inglês) somavam 27 bilhões de dólares em investimentos no ano passado, segundo os dados da Agência Internacional de Energia – um valor que tende a se multiplicar para que o setor elétrico global neutralize suas emissões de carbono até 2050.


Na Satc, são animadores os resultados obtidos até aqui. Por enquanto, os testes têm sido realizados numa planta-piloto na qual a queima de um gás combustível simula o funcionamento de uma termelétrica – o projeto foi implementado com recursos da Eneva, empresa de exploração de gás natural no Brasil e geradora de energia com três usinas termelétricas que somam 2,8 gigawatts de capacidade instalada. A nova tecnologia mostrou-se capaz de capturar cerca de 50% do carbono emitido.


O projeto consumiu até agora cerca de R$ 11 milhões e está prestes a entrar numa nova fase – a última antes de uma aplicação comercial. Para isso, outros R$ 11 milhões devem ser investidos nos próximos três anos. O primeiro desafio desse período é elevar o percentual de carbono capturado para 90%. O outro é baixar os custos por tonelada de carbono sequestrada dos atuais 50 dólares para algo próximo de 30 dólares, patamar no qual a tecnologia passa a ser competitiva para uso em termelétricas, segundo acreditam especialistas mundo afora.


A captura de carbono é fundamental para o crescimento nas próximas décadas

Desenvolver uma solução para diminuir as emissões de carbono na atmosfera é uma tarefa de relevância mundial. Sem isso, será mais difícil assegurar o crescimento da economia global de modo sustentável. O empreendimento do CTSatc tem, além disso, significativa importância regional. Bem sucedido, será um marco na transformação do setor carbonífero do Sul catarinense. As mineradoras locais são responsáveis por manter a Satc e seu centro tecnológico. Essas empresas buscam assegurar para o carvão, um dos principais recursos naturais de Santa Catarina, um futuro limpo e ambientalmente responsável.


Não é uma preocupação recente. As pesquisas relacionadas à captura de carbono, por exemplo, iniciaram há mais de uma década. A história envolve, além das empresas de mineração, o apoio do poder público – parte dos recursos veio de órgãos como a Fundação de Apoio à Pesquisa de Santa Catarina (Fapesc). Existem mais parceiros do setor privado, como a Eneva. Em várias etapas do projeto, houve a participação de outras instituições de pesquisa, como a PUC-RS e a Coppe, vinculada à UFRJ e um dos principais centros de ensino e pesquisa em engenharia da América Latina.


A origem de todo o trabalho, porém, está numa parceria internacional da Satc com a empresa Adsorption Research Inc. (Ari), com sede em Dublin, Ohio. Os americanos haviam realizado experimentos em pequena escala para utilizar na captura de carbono uma substância pouco conhecida do público em geral, mas amplamente utilizada em diversos setores industriais, dentre os quais destaca-se o refino de petróleo.


Os criciumenses interessaram-se em desenvolver a solução em escalas mais próximas de uma aplicação real. O encontro foi promovido pelo National Energy Technology Laboratory (NETL), laboratório de pesquisa ligado ao Departamento de Energia dos Estados Unidos (US-DOE), com o qual a Satctem uma parceria para desenvolver projetos relacionados à gaseificação de carvão, à recuperação de áreas degradadas e à captura de CO2.


Tratava-se, na época, de um caminho alternativo para sequestrar as emissões de carbono. Boa parte das principais tecnologias existentes usam materiais absorventes – simplificando bastante, são solventes que incorporam em si o material absorvido. Os adsorventes, por sua vez, são geralmente materiais capazes de reter outras substâncias na superfície. É o caso da zeólita, um material sólido composto de silício, alumínio e um metal alcalino. No microscópio, a zeólita apresenta uma estrutura coberta de poros, onde o gás carbônico fica retido.


Ao longo do processo, os engenheiros da Satc desenvolveram a capacidade de produzir zeólitas sintéticas a partir das cinzas do carvão, que compõem de 30%  a 40% do minério extraído em Santa Catarina. A técnica para sintetizar o material rendeu à instituição sua primeira patente verde, concedida pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi).


O carvão pode dar origem a uma indústria ambientalmente sustentável

Quando a tecnologia da captura de carbono estiver plenamente desenvolvida, poderá equipar usinas que tanto geram energia quanto produzem insumos para a indústria de fertilizantes. Há três unidades desse tipo projetadas para o Sul de Santa Catarina. Parte do carbono capturado nas chaminés deixará de ser liberada na atmosfera para ser armazenada no subsolo. Outra parte poderá ser utilizada na produção de dióxido de carbono (CO2) para uso industrial.


As zeólitas obtidas da cinza de carvão também têm aplicação na agricultura, seja como ingrediente na composição de fertilizantes (retardando a liberação de nutrientes e aumentando a eficiência da adubação), seja como estabilizador do solo, retendo umidade (possibilitando às lavouras melhores condições para suportar longos períodos de seca). “Poderemos no futuro fechar o ciclo do carvão, aproveitando ao máximo esse recurso natural numa cadeia de produção limpa”, diz Marcio Zanuz, diretor técnico do Sindicato da Indústria de Extração de Carvão de Santa Catarina.


Por ora, os envolvidos no trabalho se mantêm entusiasmados com as possibilidades. “Já conhecemos os caminhos a percorrer para a tecnologia ganhar competitividade e eficiência na captura de carbono”, diz o engenheiro Aquino. A esperança é que, por volta de 2023 ou 2024, o sistema esteja pronto para ser aplicado numa das termelétricas da Eneva. Isso ampliaria os horizontes para o setor carbonífero Sul catarinense – e atrairia ainda mais os olhares do mercado para as pesquisas feitas nos laboratórios da Satc.


Texto: Deize Felisberto, assessoria de imprensa da Acic.

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